quarta-feira, 17 de dezembro de 2008


Se soubesses ler
O que dizem essas linhas
Talvez não achasses
Que vão leves…

Saberias que amealham
Em cada sulco
Tão profundo
A sabedoria de um deus poeta.
Que codificou o mistério
Num poema em partes
Pelas mãos do mundo.

Talvez, assim, seja melhor:
Leves.
Leves de pele
De tormento?
De grão…
Para se carregarem na terra
De calor
De vento
E de cada ocasião.

Que importa que o mar seja longe
Que os sonhos sejam pequenos
Que as certezas sejam vãs…
As mãos são vivas,
Os dias são sem pressas
Apenas levam apertadinho o desejo
De amanhãs!


(foto: Ana Fernandes)

quinta-feira, 27 de novembro de 2008

Vamos
















Vamos
Enlevados pelos passos
Que nos parecem certeiros
Dados antes de nós.
Vamos firmes
Na convicção dos pioneiros,
Sem interrogações
Como se a cabeça fosse leve…

Como se o único trilho gravado
Não pertencesse à razoável falta de razões
Para a seguir…
Como se uma vaga mais atrevida
Não nos pudesse acabar com as marcas indeléveis…

Vai.
Prefiro deter-me uns instantes
Do que me faltar vida
Para andar para trás.
Vai.
Enquanto eu falo aos meus pés
Para escolherem o caminho de areia mais grossa,
Para, findas as rectas (e as curvas…),
Bater um no outro e sobrarem poucos grãos
Com memória do que pisaram.
Vai,
Mas não te esqueças
Que és o único pioneiro dessa vida!
Eu vou a olhar para frente,
Espanando as passadas,
Para que não venham outros

(de vontade esquecida)
Dar a lugar nenhum!...




(foto: Ana Fernandes)

quarta-feira, 8 de outubro de 2008

Porto













Sente-o.

Vai pelos passeios,

Pela calçada,

Pelas ruas sombrias

De cabeça levantada.

Vai pelos Leões à Cordoaria,

Conta os degraus até à Torre,

Desce à Avenida

Espreita antes na Lello,

A livraria.

Olha o D. Pedro na praça,

Passa pelas igrejas,

Pelas capelinhas,

Entra nos cafés

E mata a “traça”,

Cumprimenta a malta,

Ouve a simpatia,

As charadas,

O calão.

Mata a sede nas biquinhas,

Nas fontanelas

Com o S. João.

Vê os azulejos de S. Bento,

Para o cimo a Sé,

As travessias

Com os outros dom’s

E donas Marias.

Desce pelo Mouzinho,

Vê o Mercado,

O outro Palácio,

Sente o povo,

A ribeira,

O Douro,

O sabor do nosso tesouro

Num cálice novo.

Senta-te aí à beira,

Sente a aragem

Olha para o cais

E não te esqueças

Que do outro lado,

A vê-lo,

Há mais

Paisagem!

Lá, onde atraca o rabelo

E este olhar abençoado!

(foto: Ana Fernandes)

quarta-feira, 30 de julho de 2008

Raízes

Deus criou a terra onde me espraio

Que invado com ternura,

A mesma terra onde rejubilo

Sinto o doce

E exponho a amargura.

Uno-me à terra

(Pequenos retalhos do mesmo chão)

Que me dá colo,

Que me nutre,

Onde me consolo

E de onde pulsa a minha respiração.

Aí onde eu descanso,

Me agito,

Solto um abafado grito

Antes de me erguer

Além das raízes,

Em tronco largo,

Copa repleta de flores.

Chão onde me uno,

Em dias felizes,

Aos meus amores!

sexta-feira, 6 de junho de 2008

Amigos


Janelas que se abrem

E deixam o interior mais iluminado,

Portas abertas

Que nos fazem sair,


Laços que se apertam

Até ficarem nós,

Até nós ficarmos enlaçados…

Pelos olhos que nos acolhem,

Pelos sorrisos que têm resposta,

Pelos (a)braços que nos acalmam,

Pela partilha que encontra o silêncio,

Por aqueles que nos conhecem connosco.


Porque se sente para lá do que é evidente

E não se duvida e alimenta (sempre)

Engrossam-se os laços, os fios, as teias

Onde queremos cair!


(foto: Ana Fernandes)

quinta-feira, 5 de junho de 2008

Expressão




Tantas palavras para dizer

E fico muda,

Tantos gestos, tantos toques

E eu sem me mexer...

Sobra-me a expressão

De mais um sentimento

Certo.

Que duvido...

Fecho-me numa evidência

Que nada transparece.

Encerro em mim a alegria,

Que entristece...

Compro umas flores,

Cor para mais um dia,

Luto menos negro para os dissabores.


(foto: Ana Fernandes)



Ex-pressão

Afinal as palavras romperam,

Os gestos contidos rasgaram

E mudou a expressão...

Da dúvida formou-se o sorriso,

Da partilha a gargalhada

E tudo me chegou

Depois da capa desfraldada...

Porque o medo não ergueu barreiras

Eu disse tudo

(até asneiras!)

E de mim me vesti

Sem embaraços

Toquei e senti mais

Do que mãos e braços

E percebi!...

quarta-feira, 13 de fevereiro de 2008

Quatro Estações


Ver troncos nus acordados pelo vento,

Ver a brancura com mais tormento,

Natureza despojada para voltar a enriquecer.


Mais horas tiradas ao dia,

Onde só o aconchego esquece a noite fria

Desejando o cheiro de um outro amanhecer.



Voltar à calma que antecede o parir,

Voltar às cores como para colorir

De sonhos esta vida.

Envergonham-se as árvores como Adão

Procurando depois a absolvição

Com a folhagem vestida.



Dar aos corpos a quentura,

Dar ao desejo a aventura


É deixar a lua mais iluminada.

Aumenta a sede em cada boca,

Queixando-se de ser pouca

A temporada assim passada.



Pois de novo perde-se o pejo,


Crescendo em todos o desejo

De continuar cíclica a criação.

Só assim as esperanças são mantidas,

Com menos horas e mais folhas caídas,

De sorrir ao receber cada estação!

Estendo os braços


Estendo os braços...

Palmas viradas,

Vazias,

Estendo as mãos

E espero que se encham

Com os dias.

Pesam-me os braços

Mas nas mãos, nada.

Pesam-me, mas espero

Cansada.

Talvez não deva esperar,

Talvez deva ir à procura,

Esgravatar.

Pois a vida não tem de ser dura,

Nem de espera,

Senão, assim, será sempre um

"Quem dera!...!

Que só aguenta quem sorri a penar.

Sim,

Vou encolher esta e a outra mão.

Agitar os braços

Sem embraços,

Posso até dar um murro de contestação,

Dar um aperto convicto

Puxar para cá o infinito,

Mas estender mais, não!

(foto: Ana Fernandes)

quinta-feira, 10 de janeiro de 2008

Lume (de Mafalda Veiga)


"Vai caminhando desamarrado

Dos nós e laços que o mundo faz

Vai abraçando desenleado

De outros abraços que a vida dá

Vai-te encontrando na água e no lume

Na terra quente até perder

O medo, o medo levanta muros

E ergue bandeiras pra nos deter.

Não percas tempo,

O tempo corre

Só quando dói é devagar

E dá-te ao vento

Como um veleiro

Solto no mais alto mar.

Liberta o grito que trazes dentro

E a coragem e o amor

Mesmo que seja só um momento

Mesmo que traga alguma dor

Só isso faz brilhar o lume

Que hás-de levar até ao fim

E esse lume ja ninguém pode

Nunca apagar dentro de ti."


(foto: Ana Fernandes)